quinta-feira, 17 de outubro de 2013

O ônibus

A vida é como um ônibus, que vai a toda velocidade, um ônibus em que você precisa subir. O ônibus não para. Você está atrasado. O ônibus, majestoso em sua enormidade, você medíocre em suas pernas curtas. Você corre, precisa alcança-lo, o motorista parece perceber e pisa mais fundo no acelerador. Você o persegue, talvez por um, dois, três quarteirões. O ônibus para, as portas se abrem, o motorista sorri, você sobe. Quando passa pela roleta descobre que não é mais um menino, se tornou um homem velho e cansado. Senta-se no corredor, e só então percebe. Pegou a condução errada, e não sabe ao certo onde é o terminal.
A vida é como um ônibus.

domingo, 13 de outubro de 2013

Visão de Cabiceira

Não é como se as cores fossem as mesmas. As cinzas não estão no cinzeiro, elas nunca estiveram ali. Conto as bitucas, uma, duas, três, quatro. Pequenos invólucros de câncer empilhadas na janela. Não é como se as cores fossem as mesmas. As meias jogadas no canto do quarto, sempre estão ali. Um, dois, três dias. Partes de ti esquecidas na rotina. Não é como se as cores fossem as mesmas. O cabelo ondulado, meio pro lado, a barba espetada, meia comprida, o sorriso torto, meio cerrado. Não é como se as cores fossem as mesmas. A porta fechada, você do outro lado, as pernas esticadas, você deitado, o mundo em silencio, você sussurrando, meu nome, meu namorado. Não é como se as cores fossem cores.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Prólogo

Eu podia ver o sangue no chão, certamente não era por isso que eu esperava.  Acreditava que iria para o inferno, pelo menos é isso o que eles falam sobre as pessoas que fazem o que fiz. Certamente não tinha ideia de que estaria aqui, inerte sobre o meu corpo, visualizando o sangue jorrando. Mas parece que eu realmente me enganei. Quanto tempo já se passou? Dez segundos? Trinta minutos? Duas horas? Não sei. O sangue já parou de explodir em um grande fluxo pelo azulejo do banheiro e agora passou a apenas gotejar sobre minha pele.
Minha pele, engraçado, acho que não é mais minha pele, já que aparentemente não estou mais em meu corpo,  a minha maior dúvida é, o que sou agora? Sou um espirito? Um fantasma? Por que as coisas não podem simplesmente acabar? Alguém está batendo na porta, eu não esperava ter que assistir essa cena.
- Morg, querida,  abre a porta.
Eu queria dizer que não posso, de alguma maneira sei que mamãe não pode me escutar , mas eu a escuto e agora está gritando.  Depois de muito pedir ela passou a forçar a tranca da porta, conseguiu abrir, entrou, então começaram os gritos e o choro.  Queria poder abraça-la, dizer que não foi dela a culpa, que eu estou em um lugar melhor, mas quem eu quero enganar?  Eu não faço ideia de onde estou ou o que sou agora, ainda não decidi se é pior, mas definitivamente esse não é o lugar que eu esperava.



quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Fada do Outono

As folhas caiam anunciando o começo do outono,  a estação trazia consigo a esperança de dias calmos. As árvores despidas exibiam esguios galhos cujas sombras projetadas em minha janela causavam arrepios. Durante a noite acordei assustada, não sabia ao certo o que me despertou. Meus pés se moveram para fora da cama, e quase como se eu não tivesse controle sobre meu corpo fui levada até a janela. Então eu a vi, emanando sua luz, suas asas balançavam e seus pequenos olhos brilhavam como diamantes, ela não parecia ter notado a minha presença, eu não conseguia parar de fitar sua trajetória.
Com delicadeza, ela sentava em um galho por vez fazendo com que o mesmo magicamente balançasse lançando suas folhas remanescentes ao chão. A observei por toda a noite, maravilhada, sem fazer som algum, me deliciando com o bater delicado de suas asinhas e o sorriso airoso em seu rosto tão pequenino.
Quando já não conseguia manter meus olhos abertos, calmamente me dirigi a cama, o sono me abraçou quase instantaneamente, e que sonhos lindos os que tive. Voávamos, eu a pequena criatura pelo céu estrelado tendo somente a lua como observadora.
Na manhã ao acordar encontrei ao pé da cama uma folha seca dançando conforme a brisa a tocava, e então soube que tudo havia sido real.